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O que está acontecendo?

23/04/2023

Revelei um filme pela primeira vez na vida

Eu falei sobre fotografia nesse texto aqui (O capricho da fotografia), e de como nunca revelei negativos. Bem, estou ficando velho e parece que os velhos acabam de alguma forma revisitando o passado com cada vez mais frequência, mesmo não querendo, já que ele surge como uma assombração cobrando coisas mal resolvidas. Então outra vez voltou esse interesse e outra vez fui tomado pela vontade.

Nessa onda enchi o carrinho no Mercado Livre e quando dei por mim já estava aguardando o carteiro, que me trouxe um tanque de revelação de inox muito antigo e um saquinho de tiossulfato de sódio, que é o que se usa como fixador fotográfico universal. O restante dos materiais encontrei por aqui mesmo: café solúvel, vitamina C e carbonato de sódio. Tudo isso junto faz o famoso Caffenol.

Tinha um rolo de filme Fuji Superia X-tra 400 de 36 poses usado que estava decorando minha estante. Nunca levei para revelar porque julguei na época em que bati as fotos que não havia nada importante nele. Provavelmente bati usando aquela Zenit bonita uma Chinon CP-7m que passou pelas minhas mãos nos idos de 2015. Ou seja, um rolo perfeito para uma experiência despretensiosa.

Câmara fotográfica Chinon CP-7m

Tendo o tanque e a espiral, me faltava o capuchão, aquele saco onde você enfia as mãos e coloca o filme na espiral sem perigo dele tomar luz. Improvisei com uma mochila embaixo de um cobertor grosso. De olhos fechados, treinei um pouco como enrolar o filme na espiral e fui em frente. Fiz tudo muito rápido assim que o tanque chegou porque não queria perder a vontade e acabar largando tudo de lado como já aconteceu antes. No quarto quente e escuro, com as mãos enfiadas na mochila já começando a suar, penei um pouco para enrolar o filme na espiral e tive que desenrolar algumas vezes quando sentia que ele estava encavalando todo. No fim deu certo e meti o bicho no tanque. Ufa! Misturei os ingredientes do Caffenol seguindo as orientações do site Caffenol.com.br e segui os passos da revelação e o processo de agitação.

Foto de um tanque de revelação, espiral e rolo de filme
Roots!

Quando finalmente abri o tanque e comecei a desenrolar o filme da espiral fiquei desapontado. A película estava absolutamente escura. Na hora pensei que eu tinha exposto o filme a luz ou que eu havia errado no processo de agitação. Deixei a película secando e fui fazer outra coisa para esfriar a cabeça. De fato, posso ter agitado o tanque menos do que devia e talvez o revelador estivesse acima de 20 graus. Também cometi o erro de não pesquisar na Internet para ver se a revelação daquele filme colorido em particular não precisaria de alguma mudança na fórmula ou no tempo de revelação. Também posso ter errado nos ingredientes. Vamos dizer também que o rolo esteve exposto na estante por mais de cinco anos. São muitos fatores!

Foto de dois negativos, um revelado com Caffenol e outro em laboratório
O negativo que revelei com Caffenol comparado a uma revelação de laboratório.

Depois de seco, analisei melhor o filme e vi que havia sim alguma coisa naquela escuridão toda. Mesmo tendo o recurso de digitalizar negativos, meu scanner de mesa não conseguiu pegar nada porque o filme estava denso demais, então tive que usar a Canon 5D para fotografar os negativos. Depois precisei puxar muito os controles no Camera Raw do Photoshop para conseguir tirar alguma coisa.

Como digitalizar negativos com uma câmara digital?

É um contrassenso você bater fotos com filme, usando uma câmara de cinquenta anos, para depois digitalizá-las porcamente. Mas assim é o ser humano, não?

Para digitalizar os negativos usei minha Canon 5D com uma objetiva de 50mm e dois tubos de extensão para macro, dando um extra de 34mm. Uma abertura de f/8 ou f/11 e o ISO mais baixo possível que foi de 100. A velocidade do obturador não importa desde que tudo fique firme. Fiz dois tubos usando uma capa de apostila, aquela folha de plástico grossa. Um tubo entra no outro e você enfia a objetiva numa ponta e na outra prende o negativo. Ajusta os tubos para a região de foco e focaliza no automático. Aponta a câmara para uma fonte de luz branca e clica. No fim consegui negativos de mais ou menos 6mp. Eu poderia usar um tubo de extensão a menos usar um tubo de 31mm no lugar do de 21mm e conseguir usar melhor o tamanho do sensor da Canon, mas acho que vai dar muita distorção nas bordas. Preciso fazer mais testes e montar um setup mais caprichado.

Canon 5D com tubos extensores para macro
Tubos de extensão são a forma mais barata de diminuir a distância de foco mínimo e fotografar o negativo aproveitando a maior área possível do sensor.

Vamos ver o que um rolo de 36 poses virou?

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Não está mal para uma primeira vez, considerando todos os fatores. Dizem que o Caffenol é bastante tolerante a erros e essa parece ser uma constatação. Obviamente que o Photoshop fez milagre. Me pergunto se seria possível conseguir isso usando um ampliador. Usar um ampliador seria legal! Quem sabe numa outra onda de nostalgia?